terça-feira, 13 de março de 2012

Ela passou duas noites inteiras chorando e pensando em uma forma de morrer que não desse muito trabalho nem fizesse muita gente sofrer. Uma morte sem sujeira ou que parecesse um acidente para que seus pais e seus amigos não se culpassem pensando que não lhe deram amor e atenção suficientes.
Morrer parecia doce se ela pensasse que alguém do outro lado a esperava com abraços de conforto. O ruim era só que, havia, certamente, a possibilidade de que não houvesse nada do outro lado. Daí era horrível pensar no vazio, no escuro, no nada. Fechar os olhos e ao invés do tal túnel de luz encontrar o nada.
Ah ela era vaidosa demais pra deixar de existir, um mundo (material ou espiritual) sem ela era inconcebível. A idéia de morrer era péssima, mas a de continuar na agonia era pior ainda.
Nos últimos doze meses a vida tinha sido de cão. Cães danados. Dor, perdas, sofrimento, frustrações, humilhações, fracassos, derrotas. Era coisa demais para aquele pobre coração.
E ela chorou e sofreu e se lamentou e brigou com Deus. E se sentiu inferior, e se fez de vítima e ficou carente. E sentiu desespero e desânimo e impotência. E quis desistir.
E pensou muito em uma forma de abandonar tudo, mas o caso é que sempre depois de duas, três, quatro horas seguidas de choro chegavam umas idéias. E ela colocava "Open your eyes" do Snow Patrol pra tocar e se imaginava andando na rua com um ar de vitoriosa, de sobrevivente. E imaginava o sucesso profissional batendo à porta e ela desfrutando o gosto dulcissímo da glória.
E a sensação de benção que chegaria quando a vida, que agora só lhe trazia surpresas ruins, começasse à jogar à seu favor. Pensava nos muitos pratos que faria pros amigos, nos mapas astrais, nas viagens, nas lindas fotos dela mesma.
Chorou duas noites seguidas e decidiu que não tinha vocação praquilo. Não importava qual notícia ruim pudesse chegar nos próximos dias, a partir de agora ela iria assumir sua alma espartana pra valer.
Se os céus estavam lhe mandando o pior da vida, ela iria contrariar e oferecer o melhor dela.
A desesperança não combinava com ela. Ás vezes, até tentava vestir aquela personagem cheia de angústia e mágoa, mas durava pouco. Ela tinha energia demais, esperança demais, paixão demais.
Tentaria todas as possibilidades, todos os caminhos, todas as opções.
Não tinha jeito, a sorte se veria obrigada a voltar a jogar no seu time.
O azar não era páreo pra ela.
Então ela se levantou cheia das suas idéias pós-choro, toda orgulhosa de si mesma e sem nenhuma modéstia. E seu anjo da guarda deu um suspiro de cansaço e alívio: finalmente sua protegida voltara ao estado normal. Depois, o compreensivo anjo sentiu pena do Diabo: ele insistia sempre mas não havia jeito, a menina era uma das preferidas da Virgem.

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